Encontros com o Leão
 

Graça Caldas


Fanfarrão e genial, talentoso e destrutivo, autêntico e mentiroso, corajoso e alienado — assim o autor de Por quem os sinos dobram é apresentado pelo jornalista, poeta e ficcionista Eustáquio Gomes em Hemingway: Sete Encontros com o Leão, volume 17 da coleção Encanto Radical, que a Editora Brasiliense destina a biografias breves de nomes famosos no campo das idéias e da criação.

Esse irretocado retrato do romancista americano é apresentado através de uma narrativa de tom ficcional, que se desdobra em sete encontros imaginários do autor com o ganhador do Prêmio Nobel pela novela  O velho e o mar. Nesses encontros, o jornalista procura “penetrar na história real de Hemingway” acompanhando-o da obscuridade à fama e à decadência, até sua morte por suicídio a 2 de julho de 1961.

Eustáquio faz questão de observar que a sua visão do escritor não é maniqueísta, mas realista. Era preciso desnudá-lo, “porque Hemingway foi muito mitificado, principalmente pela imprensa”. Os sete encontros são intitulados com referências zoológicas (“O urso da carpintaria”, “O touro da Espanha” etc) porque — explica o autor — “em sua vida Hemingway sempre se orientou pelo instinto, embora literariamente fosse ultra-sensível. Era um caçador corajoso, que matava animais para não matar a si mesmo, como certa vez confessou”.

Considerando Hemingway um escritor universal — e por isso “tão brasileiro quanto Machado” — Eustaquio não esconde os preconceitos que alimentava, como a falta de consideração que tinha pelos brasileiros, embora admirasse os cubanos e os latinos em geral. Na origem desse preconceito, lembra o autor, “parece estar sua antipatia pessoal por Carmen Miranda e uma briga que teve com um jornalista brasileiro”.
Contraditório, ora engajado, ora alienado, Hemingway — segundo Eustáquio — nem sempre mereceu a fama, especialmente como jornalista (suas informações eram pouco confiáveis), mas, a despeito de tudo, viveu intensamente e soube sair de cena no momento em que sentia a própria luz se apagar.

Jornal do Brasil, 23 de janeiro de 1983